29.6.08

Ao vento

Essa sensação que sinto ao lado teu
Não é simplesmente.
Em tentar preencher o vazio
Entre nossos corpos com palavras
Sem intervalos, ruídos intermitentes.
A certa altura perco os sentidos
Minha boca insiste em proferir
Mas me sento ao longe de tudo
E observo.

Essa tentativa, impulso do nada
Que é medo.
Medo de que me leia nos olhos
Porque em algum lugar em mim, sei:
Ainda não.

Não quero que me veja
O buraco negro interior
E isso é não estar pronto
Para deparar-se com o outro.
Observo porque devo aprender
E as areias verdes desmoronam em avalanche
Na ampulheta caótica do tempo
Tempo das coisas fugidias
Tempo das coisas mortas
E de que sejam enterradas.

É que já não quero
Abarcar o mundo num só passo
Mas dar passos cada vez mais largos.
E a cada tropeço, sinto mais forte
Só não desejo embrutecer
Mas se necessário faz,
Lapidar

Que me importa quem
Se com olhos de neblina
Aquilo que vejo talvez seja imaginado
E a distinção do real é sutil
Que chego a ver melhor
Com olhos fechados.

Simples, se não conta visão
Que seja no tato
No cheiro
E é este diante de mim?
Não importa agora
Importa antes ser
Sem isso, nada nunca É.

22.6.08

Quando nomeia chuva

A que não sabia pertencer
Sem pertencer a si
Antes e por último.
O pé cravado na terra
Corpo fluído,
tanta água que não continha.

Incautos olhos em represa
qual logo soube não cabia
Acaso sabia não haver
Mas por acaso se sabia
que punha olhares nas feições alheias
Como se tentasse alcançar pela distância
Algo tão próximo e a perder de vista

"Tão perto ilude os olhos"
A si mesma às vezes dizia

É que não podia conter
Uma vez que pusesse olhos
No encontro da chuva que precisa cair
com a terra que chama chuva
Saberia confiar outros sentidos
O olfato tomaria conta
E finalmente choveria.

17.6.08

novos caminhos



Do meu corpo um templo
E do mundo um lar
É preciso luz no caminho
Trilhando verdes
Desbravando medos
e estradas de barro molhado

dançar

Dança olhando para o chão
no escuro e de olhos fechados
Se faz crer
ninguém observa
Ao mesmo tempo finge
e interpreta
E quando não, enxerga.

ciclo

Pela chuva que tudo leva
De volta à fonte
Ao ciclo contínuo
Para o novamente
Permanece o que vem a ser real
Por nele se acreditar
Até o não-mais
e o novamente

O ser ponte
O ser antena do mundo
E o silêncio

tato

Meus olhos conhecem
o caminho de minhas mãos
Tateio no escuro
Escrevo no tato

O outro

Um encontro no sutil
Porta que se abre
soprando em vendaval
folhas de outros outonos
Medo
Fecho a porta
Escondo os olhos
Vazio opaco
Procuro o brilho
que vi outrora refletir na lua
Respiro fundo
E saio para dançar no vento
Pisar em folhas secas
Nunca danço sem o brilho necessário

Recipiente

Para que condensem novamente
Em nuvens férteis de sentido
E precipitem palavras em chuva
Onde quer lhes for possível

Como oceano que volta a ser gota
Vira rio, vaza, semeia, sente
E flui ao retornar oceano
Até não-mais
E novamente

Do rio que corre em minhas veias
Como em lágrima que o corpo chora
Responde ao sopro do vento
Como chuva quando evapora
Nuvens são seres de água
Que flutuam pelo céu afora

15.6.08

Será um belo nascer do sol



Dissipando nuvens escuras
de águas passadas
e sentidos de limitação
ilusórios e despropositais.

Da água que é vida
e se torna veneno
quando contida,
e de repente o que era
beco estreito sem saída
se mostra, uma via necessária
com um alargamento no final
que se abre em luz expansiva
como um parto,
e nasce do novo
um sentido vasto
feito de duas palavras
propósito
e plenitude.

Sensação decifrada.
Toda a diferença.

Propósito

Do vício que tenho em pessoas.
Sinto como uma imagem cravada
Esculpida em memória simples
Primitiva, quase mitológica.

Como se cada ser, ao ser lançado
nesta existência desavisada
Recebesse apenas rasgado
um pedacinho de papel.
Nada mais.
Registrado ali:
Propósito.

Como sempre...
são muitas as reações possíveis.
Há quem perca o papelzinho de vista,
tem gente que esconde
de si mesmo, ou do outro
Há quem engula!
Quem rasgue...infinitamente.
Nem sei se seriam todos iguais.

Me sinto como aquela
que não bem compreendendo
algum possível sentido,
e desconfiada.
Estica o pescoço
a espiar o papelzinho alheio,
sempre buscando
entender algo de SER...

Existencial mesmo
Quase desproposital.

Quer trocar?

Deixe-me ver o que tem neste aí.

Hum...olha...

12.6.08

Luz



Das coisas e momentos
Que me trazem brilho nos olhos
Que há de mais real, é esse verde
Existência por todos os lados
Pulsando

E dos reflexos possíveis de minha alma
Este espelho de luz como oráculo
A imagem refletida no fluxo incessante
que nada diz pois não tem voz
Diz silêncio quando reflete o nada
Porque nada há ali, só consciência
Um vislumbre fluído, lampejo de cristal

É o que sou
Rio que corre
onde não há ninguém para ver
Nuvem que chove
quando ninguém a espera
Sou água.