28.11.08

cachorro do sol




Círculo perto, chuva longe.
Círculo longe, chuva perto.

Avistou o amanhã por trás da montanha mestre
Sentindo-se tola em dizer dilúvio
Entre risadas que desacreditavam suas próprias convicções
E quando falava das grandes chuvas por vir
Marcando o fim das palavras, eis que se anuncia:
A última gota de cristal transparente se lança do peito
em derradeiro gesto de proteção...
de si mesma, desvencilha e liberta
Se parte impacto, coração
Fim.

22.11.08

intensidade

Do que sonhei recente
Nada vinha de encontro
Nem encanto, nem faz-de-conta
Nem água, nem lua
No meu conto
Fugia eu,
na crina de um cavalo branco.

Cabelos flutuando indomados
Sem sela, eu cavalgava
Nossos corpos comungavam
em perfeita sintonia
A favor do vento
No compasso embalo do tempo
Eu e o cavalo éramos um.

E tudo o mais ao redor
Tudo parte
Todo

E embora exista o vazio
Nem era a falta que a busca movia
Era excesso, transbordamento
Queria despir-me de alma
esvaziar-me, encher-me,
esvaziar-me, encher-me...
Ofegante.

Deixar tudo no encalço da brisa quente soprando norte
Como espalhando sementes no caminho percorrido
Sem ocupar-se de que venham a brotar

Como se o simples movimento tórrido e apaixonado
Pudesse mover todo o entorno
na mesma direção, em ondas expansivas
Propagando brilhos no tempo
Até as próximas sete gerações.

15.11.08

voltando para a terra




Lugar de poder, me concede cura
e mostra tuas quatro faces do tempo.

Ouvi o chamado da terra.

Dizia da minha presença como retorno
Água brotando do chão, escorrendo pelas fendas e vales
percorrendo as veias do solo e pulsando viva
Tornando fértil, e deixando passos de memória
Brotando possível a vida ao redor que dormia.
A roda arco-íris
Orbitando espiral, desobstruindo fluxos
do que está manifesto e do que ainda não.

E tive medo enquanto me via destemida
a aceitar o propósito que se erguia adiante
Gerar vida, como água voltando pra terra
A luz mais elevada em prisma de cores brilhantes
Paquerando o sol que me faça mulher
E me sacie o ventre de mãe que sou
E filha e neta.
Mãe da energia criativa
Água. Mãe. Vida. Ventre.
A Terra diz chorando a ingratidão dos homens

Sim, olhei a morte nos olhos
Mas é segredo, eu respondi.

Agora as vozes estão do meu lado
Basta que tenha ouvidos para ouvir
Pois falta-me ainda o silêncio do corpo
O canal se abre em púrpura.
Entre relances de vermelho ventre.

Sim, eu disse.

Vi o encontro do céu pai azul com a terra mãe
Nuvens brancas mostrando asas pelo infinito
E árvores de raízes profundas criando vínculos
Passando adiante as gerações
Onde as superfícies de orvalho
Reluzem sonhos e sons
Verdes de brilho infinito
Tambores e cantos de pássaros
Onde as cercas dissipam tua presença através
A perder de vista,
uma à uma
linhas imaginárias de espaços sagrados
pessoais e coletivos
lugares e não-lugares
Todos interligados em unidade.
Ser e vir a ser.
E ser tudo.
E ser É.

Despertei com batidas fortes de coração pulsando
De um sono profundo, habitado de sonhos reais
Como visões que tocam os olhos
e ainda assim não creio que falem futuro,
mas sempre à frente, porvir
Medos, potências e passagens
Portas em desdobramentos quânticos.

E desse jeito tudo o mais se tornou vazio.
Nuvens dissipadas como véu de água transparente
em respingos de brilhos para lavar a alma de outros tempos
Finalmente choveu um choro profundo de cura,
tal ferida antiga qual jornada de minh´alma

Como pude esquecer algo tão parte?
Algo que havia sido perdido, retorna
Agora lembrar que a linguagem
é a primeira manifestação da escolha.

Sim, eu disse.

Sou água voltando para a terra.

2.11.08

Um muro...




Porque um dia
eu quis ser
somente
some mente
um muro
um muro só
só mente
um muro alto
somente um muro

porque um dia
eu quis ser só
mente
some mente.
some muro.


Porque um dia
eu quis ser
somente
ser
se mente
semente

brotando.